segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Até 2016





Desconectei-me com a ajuda preciosa do Natal e de uma avaria do portátil que ainda perdura. Quando me desconecto e depois volto aqui tudo me parece estranho, até o simples facto de escrever aqui. Percebo, contudo, com grande clareza, que quase nada neste mundo internáutico me faz realmente falta, já nem sequer ver os mails com assiduidade. Estes compassos de tempo sem acesso virtual mostram-me que tudo o que importa é aquilo que está ao alcance das minhas mãos, exceptuando, talvez o céu. Tenho uma sede imensa de natureza, de contacto humano, de fazer coisas que se materializem. O Natal deu-me quase tudo isso, excepção ao mergulho nas plantas, na areia, na imensidão das estrelas, no fundo do silêncio, nas ondas do mar.

A família é ainda a família, reconfigurada como deve ser, isso é de grande reconforto, não obstante saber e sentir que passamos muito tempo perdidos uns dos outros, distantes como nunca estivemos ou fomos. Se os rituais são ainda momentos de aproximação, que venham eles como os nomes ou com as conotações que tiverem, já pouco me importa o nome das coisas.

Consigo desligar-me sem que isso me perturbe minimamente, coisa que já vejo em poucas pessoas neste mundo e é com tristeza que o digo e que o sinto. Se não escrever, não estranhem, não se trata de odiar este meio de comunicação com os outros, respeito-o e até gosto dele, mas sinto que é tão necessário o seu inverso, a paz de nada saber do que se passa, do que todos dizem, do que todos sabem por força da massificação do acesso virtual, contam-se as mesmas notícias, os mesmos eventos, todos viram os mesmos vídeos ou sabem a última anedota que circula na Intenet. Se não vimos por nós mesmos o vestido que muda de cor consoante a luz, alguém nos contará e isso foi um dos factos de 2015, uma coisa sem importância nenhuma.

Há ali céu, estrelas, mar, há bichos escondidos nas águas e a voar pelo ar, a terra é quente e húmida e fala connosco se estivermos atentos. Há gente  a morrer na terra e da morte não se volta. Mas há também sangue a pulsar nas nossas veias e um mundo para descobrirmos no interior de cada um de nós. Por isso, todo o meu desejo, em 2016, é encontrar pessoas mais livres, mais originais, mais capazes de assumirem a sua singularidade, de se besuntarem com a vida que vem imbuída em artes que se fazem ao vivo como o teatro ou a música, de se ligarem a comunidades, preferencialmente presenciais, de rosto com rosto. Ainda me lembro que dantes, quando alguém se conectava a nós virtualmente, se combinava mais tarde ou mais cedo um café, tudo isso acabou, não é conciliável com as centenas de amigos que se têm no facebook, não haveria agenda para marcar tantos cafés. Vou, há ali uma tarde de chuva à minha espera.

~CC~

 



domingo, 20 de dezembro de 2015

Quase Natal



Vamos chegando aos poucos, a mesa alarga-se. Talvez goste mesmo é destes dias antes quando o cansaço ainda não me domina. Destes dias em que se vão contando coisas, o almoço se prolonga, mergulhamos todos no sofá mesmo que para ver um filme piegas. Cada vez chegará mais uma das meninas, cada vez maiores, que seria do Natal sem elas.

Uma casa tão grande esta e sempre tão solitária, agora pulsa, fala, enche-se. Às vezes custa um bocadinho conciliar tudo mas é desta aprendizagem que o amor tece os seus fios. 

~CC~

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Eram maternidades...



O meu irmão brasileiro foi operado num hospital privado aqui em Portugal, quis saber o número do piso, quarto, etc. Ele informou-me que era fácil de lá chegar, estava na maternidade. Preocupada, perguntei-lhe pelo choro dos bebés e se não era incómodo estar ali. Respondeu que não, não dera pelo choro de nenhum bebé. Nunca tinha pensado estar numa maternidade, considerando que seria um exclusivo feminino. Temos, portanto, maternidades convertidas em salas de pós operatório. Que mais se irá converter neste país?!

~CC~


segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Compras ao fim da tarde



- 2 caixas de chá, uma de laranja e outra de frutos vermelhos (são lindas estas caixas se metal pintado)
- 3 barrinhas de chocolate preto, uma com menta, outra com mirtilos, outra com café
- 2 sacos de chá de perpétuas roxas
- 4 sacos de gengibre desidratado
- 1 caixinha de pétalas de rosa
- 1 pão da lagoinha

Resultado: Mais 15 minutos na caixa na conversa com a empregada a explicar as coisas estranhas que comprava. Só não perguntou o que era o pão da lagoinha, a única coisa que me aproximou de uma cidadã comum que vai ao supermercado ao fim da tarde. O que mais me aproximou de alguém à beira da loucura: o gengibre desidratado, uma coisa que é fresca, doce e picante...como pode ser?!

~CC~

domingo, 13 de dezembro de 2015

Ausência



Ausência é o nome da última peça que o teatro o Bando apresenta, creio que a segunda de uma trilogia que retrata o drama dos migrantes, dos que partem, dos que chegam a um lado qualquer e dos que nunca chegarão a lado nenhum.

Não estou aqui para a crítica teatral, embora não me importasse de abraçar tal profissão, tal como crítica de cinema, de literatura, de gastronomia, enfim todas as criticas...eis uma vida com que sempre sonhei, muito embora deva custar ser detestada pelos criticados.

O dispositivo cénico é o melhor, a par do texto. O migrante que é só um ser humano cuja pátria não é representada, tal como ele é uma mistura de vários povos migrantes, leva do seu passado duas bolas grandes que guarda nos bolsos de uma bata. Uma delas é a lembrança e parece feita de terra e a outra é a esperança e parece feita de gelo. Quando ele chega a um lugar é barrado por uma fronteira hipotética, aqui representada por um extraterrestre que lhe diz que só há lugar para uma das bolas e ele tem que escolher, tomar uma decisão. Ele tenta argumentar para levar as duas, transgredir, mas a barreira é poderosa. Acaba aqui a peça.

No fim a conversa, uma das coisas melhores que o Bando tem. Mas ao mesmo tempo lá se vai o que sentimos, é o risco de interpretar. As interpretações dos presentes eram metafóricas, lindas, profundas. A minha era colada à realidade material da coisa, o que podes transportar quando foges? Quando já partimos de um lugar e nos dizem que só podemos levar uma coisa, é preciso escolher. Passei por isso quando tinha nove anos e a única coisa que trouxe do meu passado foi uma almofada, qualquer coisa que uma família que foge da guerra hoje não deveria deixar o filho(a) trazer. Mas eu sou filha de uma família irrealista. Além disso essa família talvez imaginasse que havia uma pátria além daquela em que os filhos tinham nascido. Tudo era diferente e, contudo, há esse traço, essa ferida, ter que partir deixando uma vida inteira para trás, coisas, muito mais que coisas talvez.

~CC~






sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Anti psicologia



Aprendi bem a lição. Trazer as sombras à tona para as ver à luz do dia. O problema é que nem sempre as sombras se deixam penetrar pela luz do dia e às vezes o dia não tem luz.

Há receitas alternativas que não aprendi mas experimento e até resultam, por exemplo, enterrar bem fundo. Dar-lhes, como às filhozes ou ao coitado do perú um cálice de aguardante, o que está adormecido não nos incomoda. Por favor, não digam a ninguém que sou psicóloga, sempre tive um jeito genuíno para a culinária, trabalhando algumas transposições, a coisa até funciona.

~CC~

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Viagem a várias partes de mim


Parei o tempo de tal maneira que ontem queria voltar a trabalhar mas já não sabia, não conseguia. Parecia-me impossível o ritmo a que costumo desenhar cenários e fazer planos, dois e três em simultâneo e em contextos às vezes paralelos, trabalhos vários.

Ainda assim, qualquer coisa se manteve. Romper com os espaços tradicionais das aulas e marchar com eles em plena cidade, levando balões laranja, levantar a voz contra a violência doméstica. Estas outras coisas unem-nos mais e sinto que ganho mais o respeito deles.

Depois, de Sexta a Terça, andar de um lado para o outro visitando amigos em tempos, espaços, contextos e vidas totalmente diferentes. Olhando para essa viagem, é como se cada um desses portos me levasse a uma parte de mim. Um puzzle onde várias peças encaixam quase sempre, às vezes uma ou outra com mais dificuldade. Uma sensação de alegria no final dos quatro dias, apesar do cansaço, um outro cansaço diferente do habitual. Dizia Neruda: confesso que vivi. Sinto isso muitas vezes. Quero por ora tirar o passado do verbo, confesso que vivo, às vezes demasiado intensamente, na ânsia de beber tudo o que a vida me pode trazer.

Satisfaz-me estar tão bem numa casa de luxo à beira rio, soberba num dia de sol (sábado) como na cabaninha de madeira, tudo pequeno e modesto, acordar com uns pingos de chuva (segunda). Satisfaz-me tanto estar com os reputados académicos que festejam a passagem a catedráticos como na pequenina olaria que um amigo tem na serra. Satisfaz-me estar com a velhota que hoje levei à aula e que me falou de amor quase todo o tempo, não obstante dizer que nunca se apaixonou e que é o que mais lamenta na vida, tanto como me satisfaz ver uma criança a brincar, a dizer as primeiras palavras. 

~CC~


quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Agora sim!





Agora sim, é de comprar o calendário!

Nota: visto em primeira mão no blogue "dois dedos de conversa".

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Sofá solo



Lembro-te que este sofá foi comprado para dois ou duas, quase três.

É às vezes grande para mim, tão grande como o silêncio do final do dia, do cair da noite, das manhãs.

E o telemóvel avariou, talvez te risses, tocarias num qualquer botão que para mim é invisível e ele começaria a funcionar.

Pronto, é só às vezes, a saudade.

~CC~

Yoga (2)



Descobri porque é que o yoga me satisfaz um bocadinho mais do que todas as coisas do género que tentei fazer antes e das quais desisti a meio, sobretudo as que faziam suar a sério. A meia luz faz toda a diferença, os espelhos não agridem, somos apenas silhuetas.

~CC~