Enquanto a bruxa má que veste Prada nos dá sempre o mesmo remédio, cuja eficácia que testa há meses não tem resultado, pois a inflação não desce, conheço mais e mais histórias tristes.
E ela sabe que praticamente dobrar o valor um empréstimo bancário é lançar muita gente no desespero. As pessoas não podem correr a vender as casas, não podem pedir mais ordenado, não podem abandonar os filhos, os animais de estimação, em alguns casos os mais velhos a quem auxiliam. Agarram biscates ao final do dia, ao fim de semana, coisas que nunca antes tinham feito. Artistas aceitam fazer limpeza de prédios, administrativas cuidam de velhotes ao fim de semana, técnicos superiores na função pública vão servir à mesa em casamentos.
Longe de estar no mesmo sufoco, também eu trabalho para além do desejável, quando verifico o dinheiro que entra dessas tarefas, tendo a achar que não foi a gratificação suficiente para todos os crepúsculos que perdi, todos os livros que ficaram por ler, todos os momentos que não passei junto de quem precisava de mim (sobretudo a minha amiga doente). Tenho uma vida inteira de trabalho adicional para pagar aqueles extras que ainda assim foram sempre o outro alimento: os bilhetes dos espectáculos, a renovação do guarda roupa, a ida ao restaurante, uma viagem a um lugar sonhado, a ajuda à mais velha ou a quem em determinado momento precisa ou precisou. Praticamente nada acumulado para além dessa colecção de momentos felizes que o dinheiro não pagou mas ajudou a construir. Enquanto o banco ao qual pago a prestação vai enriquecendo com o que pago a mais em juros, não consigo arranjar a cozinha, investir na troca do carro velho que já bebeu metade do seu valor em arranjos ou adquirir a ruína que imagino semente daquela casa branca na planície com a qual sonhei uma vida. E ainda dizem que isto é dinamizar a economia. E claro que isto são pequenos males comparados com os de outros que os sofrem bem maiores, mas ainda assim, também tenho o meu direito à insatisfação.
~CC~
Somos eternamente insatisfeitos porque vivemos num país com um governo democraticamente eleito que não nos permite ter mais dinheiro na algibeira ao fim do mês, mas que nos permite ir ao médico de borla, ser submetido a uma cirurgia de borla daqui a três ou quatro anos, ter apoios para isto, para aquilo e para aqueloutro, tem sol e mar durante todo o ano, boa comida, segurança qb., mas que continua com injustiças na distribuição da riqueza e atolado em corrupção.
ResponderEliminarMas a insatisfação diminui quando se pensa que não temos guerras, nem destruição e logo aumenta quando nos comparamos com certos paises com sociedades de maior bem-estar e conforto.
E há famílias em toda a parte que estão muito bem, outras remediadas, outras muito, muito mal.
E não é uma questão de olhar para a miséria dos outros e sentir-mo-nos melhor com a nossa. É olhar para além da nossa miséria e da dos outros e juntos construirmos algo que seja melhor para todos, mas como CC?
Eu, que faço parte deste povo que tem fama de reclamar pouco, de ser muito passivo, de se resignar, que não tem grandes índices de cidadania, de participação cívica, que só pensa em futebol, eu, repito, entrincheirado no meu individualismo, que faço? Nada. Mando uns bitaites, assobiu para o lado e deixo andar.
O voto é um direito importante mas parece cada vez nos chegar para menos...ainda assim gostava de votar para a Comissão Europeia, coisa que não nos é acessível, ou seja, um governo quantas vezes mais poderoso do que o de cada país, não é eleito. Muito menos o é o BCE...
EliminarPois é claro que tem direito, CC. Todos temos, que ela cresce e a poucos deve poupar.
ResponderEliminarO que julgo é que são insatisfações de diversa natureza e qualidade. E que muitas são bastante pesadas e restritivas. Há um excesso de erros no Reino da Dinamarca.
Sendo que o Reino da Dinamarca é cada vez mais um conjunto de países interdependentes chamado Europa...
Eliminar