Tantas reproduções que já tinha visto do Guernica, tantas. E ali diante do quadro real a dificuldade que tive em estancar as minhas lágrimas. Estava ali tudo, todos os gritos do mundo que me angustiam e enegrecem a beleza dos dias.
E segui pela sala em frente para ficar quieta e muda diante das mulheres que choram. Mulheres que têm fome, mulheres que perderam filhos, mulheres que ficam para trás em tempo de guerra e fazem dos escombros as suas casas. Estavam ali as mulheres de Gaza, as mais meninas, as mais adultas, as mais velhas. E estava também eu e o meu corpo com partes em falta, esse corpo que tapado me parece aceitável e nu me envergonha, estava também ali o meu choro sem lágrimas na cama do hospital, nos amores que morreram, nos amores que não nascem.
E depois vi a minha filha lá ao fundo numa sala, a olhar demoradamente os quadros e senti tanto orgulho nela, quando nos encontrámos no jardim já tinha o rosto limpo e provavelmente até sorria.
Mas as lágrimas, as lágrimas por vezes voltam.