Vejo-os chegar pela manhã.
É verdade as carruagens já não andam vazias e voltou aquele chiar do comboio a chegar à estação.
Mas parecem saídos de um filme de terror.
Metade do rosto não se vê, e se alguns olham em frente, outros caminham de olhos no chão. Fico a vê-los a subir a rua por um momento, metade tira a máscara enquanto sobe, outra metade conserva-a.
Hoje, na primeira tentativa de comprar pão no café vizinho, o empregado tirou a máscara ao perceber que a minha filha não estava a compreender o que dizia sobre a forma de pagamento.
Já não consigo avaliar comportamentos, eu própria terei sido provavelmente algumas vezes inconsistente. Sinto que estamos todos bastante cansados, cada um a seu modo e por diversas razões. Mas ao mesmo tempo é incrível a capacidade de adaptação, de resiliência.
Penso nisso todas estas manhãs em que os vejo chegar e partir, uns a descer a rua, outros a subir, uns já com a máscara, outros prontos a colocá-la. Nestes anos todos não terei estado assim nunca a observá-los, presa da minha pressa matinal, quase sempre a sair cedo de casa.
Os comboios voltaram a partir e a chegar. Há nisso uma alegria contida por uma tristeza que se atravessa em cada rosto semi-coberto.
~CC~