terça-feira, 15 de outubro de 2024

Lisboa que desaparece

 

As cidades transformam-se perdendo mais e mais identidade, num movimento que parece impossível de travar. Um lugar torna-se sucesso mesmo sendo originalmente um território de armazéns fabris meio feio, é transformado em restaurantes, lojas de design e de moda. Do que ele era não sobrou um pequeno museu, uma homenagem, uma memória, tudo se varreu. Mas logo noutro ponto da cidade acontece exactamente o mesmo, e são os mesmos armazéns, a mesma lógica, quase as mesmas ementas. São também pessoas muito semelhantes os clientes, gente jovem de classe alta ou média alta, já seguros na vida ou desde sempre seguros.

Se fechar os olhos e os abrir de repente não sei onde estou, circulam empregados de origem asiática que mal falam e percebem inglês e muito menos português, mas sorriem sempre apesar dos seus olhos permanecerem tristes. As cervejas têm que ser artesanais, tem que se comer pouco ou não mostrar grande apetite e os pratos desiguais, assim como as cadeiras ou os bancos.

Fui a convite mas não já consigo sentir-me confortável nestes lugares. A minha Lisboa desaparece aos poucos.

~CC~

Nota: paga-se à entrada e colocam-nos uma pulseira, a partir daí podemos comer o que quisermos do buffet...pensando bem, alguma analogia com os processos fabris que em muito se basearam na desumanização.

8 comentários:

  1. A vida não para na sua evolução quer se goste ou não das mutações que se registam.
    Abraço e amizade.
    Juvenal Nunes

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    1. Faço minhas as palavras de Juvenal Nunes.

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    2. Certo, o nosso poder é pouco, mas podemos pelo menos ser espectadores críticos.

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  2. Há quem como eu, ambicione o progresso e a evolução das cidades. Um progresso em que as pessoas serão o centro de todo o desenvolvimento e se recupere os bairros que são delas. Tenho esperança que se reverta este movimento centrado no capital, o progresso assim o exige.

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    1. Haverá por certo caminhos de resistência e de revitalização dos bairros e quem esteja a tentar isso mesmo, também darei essas boas notícias sempre que elas passarem por mim ou se delas fizer parte. Progresso humanista é um sonho bom.

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  3. Não entrei em restaurantes de tal natureza e nem sabia da sua existência. Parece-me que Lisboa, no seu afã gastronómico da nova modernidade, se deixa encantar por coisas que não valem o verbo e que são, consoante a moda, ora aqui, ora ali. Mas talvez ainda existam restaurantes clássicos, onde se entra por necessidade de aquietar o estômago, não existem pulseiras e não interessa comer de tudo (facto que não entendo se o uso é comer pouco). Mas a maioria dos portugueses está mais abaixo, não frequenta e nem conhece os ditos cujos.
    Boa noite, CC.

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    1. Há muita moda e modinha sim. Aqui e ali vai-se resistindo ou reinventando de outro modo. Boa noite Bea.

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