quarta-feira, 23 de julho de 2014

A educação dos amantes



Pensamos que nascemos ensinados, que basta seguir a intuição, que se os bichos encontram o caminho, nós também encontraremos. Tudo mentira. São inúmeros os casos de casais apaixonados que não encontraram o prazer nos seus corpos. Casos em que sexo e amor se desencontram. Mulheres que não sabem, homens que não sabem. É por isso que a Vida de Adèle é um filme tão bom. É instrutivo acerca dos corpos das mulheres e do seu prazer. É verdade que são duas mulheres a explorar-se uma à outra, eu diria que isso é bastante mais fácil, elas sabem o que lhes dá prazer, onde e como. São também mulheres e amantes muito belas e por isso penso que o realizador as escolheu como um pintor escolhe os seus modelos mas ao mesmo tempo cobriu-as de pequenas imperfeições capazes de as tornar humanas, próximas. A Emma não tem os dentes perfeitos, a Adéle não usa maquilhagem e tem um cabelo que solto a deixa com ar de bicho. Mas são tão bonitas. 

Estou em crer que o erotismo do filme reside no amor e não no sexo e na forma quase perfeita como o amor consegue combinar com o prazer. É nessa combinação que reside a instrução do filme, o seu magnífico valor educativo. É longo, tem muitas cenas de sexo, ouvi queixas à saída relativamente ao assunto, considerando-o exagerado. Discordo, se há cenas que poderiam ser cortadas, creio que não seriam essas. É bem verdade que nunca vi uma câmara mostrar tanta pele, não é apenas nudez, são os contornos, a luz, cada bocadinho que uma encontra na outra. Trata-se de amor entre mulheres e, contudo, acho que é um filme para os homens conhecerem as mulheres. Haverá algum assim para que as mulheres conheçam os homens? Não, nunca vi nada semelhante em filmes com sexo entre homossexuais homens, nem sequer Fassbinder, nem Almodóvar. 


~CC~

Nota ou quase outro post. È outro tipo de instrução que é filmada nas cenas em que Adèle aparece no Jardim de Infância como educadora mas é o mesmo amor por trás da câmara que filma aqueles miúdos, nunca os vi tão naturais, tão eles próprios. E as cenas em que Adéle, triste, tem que lidar com a alegria das crianças que exigem dela e a querem,  tocaram-me muito. Também eu já dei aulas assim triste, a pensar em cada minuto que eles iam reparar e ver que na realidade eu estava a chorar. E como ela nunca deixei de ir, fui sempre nos dias mais tristes, engolindo para dentro a dor até a poder soltar em lágrimas, como quem solta um rio.



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