Fiz 52 anos no dia 22 de Setembro. No dia 21 a médica conseguiu finalmente contactar-me, andava à minha procura desesperadamente por causa do resultado das biopsias (que deviam ter chegado só a 25). À porta chamou o meu marido, disse-lhe que entrasse. Tudo ficou dito nesse instante. Mas o meu acompanhante não era o meu marido, apenas um colega e amigo da escola, por isso ficou lá fora. Os vínculos têm designações estranhas para os médicos, eu podia preferir que fosse um amigo em vez do marido a ouvir o veredicto.
Foi a prenda de anos mais absurda que recebi por ser tudo ao contrário de uma prenda de anos, era apenas uma semente de tristeza que tentei, tento não deixar germinar.
A médica abraçou-se a mim o que estranhamente deixei, não gosto de me deixar tocar por estranhos. É verdade que ela me chama princesa, é doce, e diz que eu sou maravilhosa. Parte daquilo talvez conste em algum livro de medicina mas a parte que conta é a que é mesmo dela, é genuína. Deve ter muitas princesas, mas eu passei a ser mais uma e isso é o que importa.
Foi um bocadinho triste o acordar mas não foi o meu dia de anos mais triste de sempre. Lembrei-me de quando fiz 15 anos e queria ir lanchar fora com as minhas amigas mas não tinha dinheiro para tal, a minha mãe disse-me que faria um bolo em casa e podia trazer 3 ou 4 amigas. Assim foi, ela fez um bolo com cobertura e diluiu o Tang num jarro. Nada daquilo era o que eu queria, sentia-me triste como só aos 15 anos nos podemos sentir, uma mistura crua de hormonas de crescimento com a revolta imensa perante o destino.
A minha luta mais dura foi para sair da pobreza, coisa que fui conseguindo muito a custo mas sem amealhar o que me era merecido pelo trabalho intenso dos anos. O mais difícil foi fazer duas licenciaturas, um mestrado, um doutoramento, tudo isso sempre com muito pouco dinheiro. Agora é só a luta contra a morte, já lhe ganhei duas vezes (dois acidentes graves), serei mulher a sério se lhe ganhar uma terceira, mas se perder, que se lixe.
Não, o dia 22 de Setembro de 2016, apesar de ser aquele em que acordei pela primeira vez sabendo que tinha cancro não foi o mais triste da minha vida. Talvez seja apenas o primeiro dia de uma outra vida que tenho que aprender a viver.
~CC~
Não há duas sem três, diz a sabedoria popular. Desta vai vencer também. Fico a torcer, do fundo do coração.
ResponderEliminarUm abraço forte, CC.
Coragem, CC!
ResponderEliminarToda a força!