As saudades que eu tenho dela chegam-me com cheiro. É um cheiro a bebé como se ela nunca tivesse crescido. É um cheiro a Primavera, como se só tivesse estado com ela nessa estação. É um cheiro a praia, como se todas as horas boas que vivemos tivessem por perto o mar.
~CC~
Também tenho saudades dela CC, do tempo em que ainda não fugia das minhas ternuras, nem os meus beijos e abraços lhe causavam embaraço.
ResponderEliminarQue saudades dela bebé, quando ainda não me reprimia, de a empurrar no baloiço, quando as suas costas voltavam atrás para as minhas mãos.
Que saudade do tempo em que ainda não me respondia com enfado, até que eu, dócil como um apóstolo, lá me fui afastando aos poucos.
Confesso que sinto ciúmes da mãe dela, por a preferir a mim, daquele sentimento sólido entre as duas, daquela energia, e o modo como se habituaram a não contar comigo para nada, dava-me a sensação, tantas vezes ao sair de manhã, de que eram elas as duas juntas a empurrarem-me para a porta da rua.
Sim, sei que sobre mim pesam as ausências, as horas extraordinárias, as idas ao futebol e que a minha figura era notada apenas quando chegava a casa.
Com o passar do tempo, nos serões de fim-de-semana, enquanto as duas viam televisão e comentavam o que viam, eu fechava-me nos livros e se me pediam alguma opinião, com relutância tirava os óculos e respondia-lhes em monossílabos.
Mas ao mesmo tempo amo a vitalidade da sua união, e olho para ela com um sorriso, pois sei que assim está amparada e não precisa da minha própria proteção.
É uma preocupação a menos e como diz a sua mãe eu sempre fugi delas.
Era ela que a levava ao médico, eu era apenas o motorista que ficava na sala de espera, entretido com um jornal ou um livro, mais ou menos desligado do que se passava na consulta - estava em boas mãos.
É uma rapariga sensível, mas de repente o seu humor muda, tornas-se nervosa, raivosa até. Sempre suspeitei que essa ira misteriosa que por vezes lhe emerge desgovernada, tenha crescido herdada de mim. Nunca o confessei.
Neste quase vazio da nossa relação, curvo-me com o peso do remorso e da culpa, de pai que tanto desejei ser mas do qual não passei de uma pálida miragem.
Compreendo-o bem, já ouvi outros homens queixarem-se do mesmo, de que as mães tecem um laço tão forte com os filhos que não se apercebem sequer que deixaram de fora o pai... e até o marido. Todas as dinâmicas familiares são um resultado de um conjunto, não há na maior parte dos casos vitimas, culpados ou inocentes. Mas na maior parte das vezes não se quer ver, analisar, muito menos mudar (sem culpas, nem remorsos).
Eliminar~CC~
o cheiro dos filhos, se houve entre eles e os pais uma boa relação, é sempre cheiro da primavera e sob o chão que pisam nascem ervinhas verdes; por escuro que o dia se apresente, mal entram em casa logo um súbito claro de sol esclarece a todas as coisas e distingue cada uma.
ResponderEliminarBoa noite.
Poesia pura Bea, eis o que são as suas palavras.
Eliminar~CC~
:)
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