terça-feira, 30 de setembro de 2025

Não vi, vendo sempre

 


Ela está à nossa volta mas são tantas as vezes que não a vemos.

Descobri um trilho que tem um caminho de pedras por dentro da zona verde que envolve o meu local de trabalho. Nesse caminho descobri charcos de água com juncos, inúmeros arbustos carregados de frutos incomestíveis mas belos, flores que sobraram do Verão, gralhas enormes que a todo o momento pousavam à nossa frente e cruzou o nosso caminho um pica pau lindíssimo de longa cauda. Apanhámos medronhos e comemos, um mês a quinze dias antes estariam maravilhosos, os arbustos estavam carregados e eles tinham já secado um pouco. Apanhei alecrim para os temperos. Há abelhas por todo o lado e nem nos ligam, centradas nas flores, até lhes perco o medo. Os múltiplos formatos dos sobreiros, enormes e majestosos, são um oásis para a vista. Também se luta e muito contra os mosquitos, por baixo dos sobreiros entramos no seu amado território. 

Mas estava tudo ali? Esteve sempre? Nunca vi, vendo sempre.

Quando os levar por este trilho, a ver o que estando ali nunca viram, vou saber se como eu se derretem na eco poética ou se lamentam, invocando o conforto da sala (e o telemóvel de uso livre por aqui) ou se dispõem a ver. É com estas coisas que todos os anos perco alguns para sempre, este ano quando começar a chuva e lhes disser que tragam capas e galochas para irmos pelo verde que mora na cidade, talvez me abeire de algum desastre, todos os anos fico perto. Arrisco saber se vão gostar de andar de olhos abertos, há também sempre quem goste ou quem aceite abri-los, mesmo que nunca o tenha feito. 

Sem desafio, tenho dificuldade de existir e ser.

~CC~



1 comentário:

  1. A sua crónica de hoje mais parece uma aguarela de Cesário Verde!
    Como Guerra Junqueiro nos disse e a CC insistentemente nos faz o favor de relembrar, é nas coisas simples que encontraremos a felicidade.
    Bom dia.

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