segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Coisas e causas domésticas



As amizades que desaparecem não doem como um amor que acaba. È como comparar uma dor forte no peito a uma dor suave e duradoura numa parte qualquer do corpo, não mata, não nos traz ódio, é só uma tristeza que fica, que parece ir, que volta às vezes. Ontem à noite raspei uma courgete para a salada e lembrei-me de quem me tinha ensinado a fazê-lo. Lembrei-me por causa desse gesto pequeno, tão trivial, tão doméstico, de tantas outras coisas que tinha vivido com essa amiga. De uma amizade boa que permitiu atenuar momentos de dor, meus e dela. Não, o caso dela não é igual ao de outros amigos que o tempo afastou, que vivem longe de mim, mas que ligam às vezes. Há doçura quando ligam, há saudade. O silêncio dela comporta alguma dor que não sei interpretar, alguma zanga que não disse, algum mal estar que não transpareceu inteiro e pleno. Se voltar teremos perdido meses das nossas vidas, coisas que não dissemos, tempos que não vivemos. Se não voltar ficará a sua memória, mais alimentada por coisas boas do que por más. É bom que a possa guardar assim, mas preferia que não tivesse ido. Não gosto de perder amores mas amigos muito menos. Envelhecer é também querer que as coisas permaneçam, que não mudem, é querer o conforto de quem nos conhece.

~CC~

3 comentários:

  1. Pois é Maria, por acaso li, mas o que despoletou em mim alguma tristeza e saudade foi mesmo a confecção da saladinha, coisa em que a minha amiga é mestre, faz umas saladas muito boas.
    ~CC~

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  2. Por mais que o tempo passe e nos traga experiência, nunca estamos preparados para estas perdas, sobretudo quando nem vislumbramos o motivo. Infelizmente, sei como é.
    Beijinho

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