sábado, 13 de abril de 2024

Sopra forte o vento e alto o grito dos pavões

Também ela morava no 20, outro 20.
 

Terra varrida pelo vento. Ela dizia sempre isso, que este era um lugar de vento forte.

Terra lisa de beijos e abraços, pouco a pouco se foi desertificando.

Ainda assim a segurar os laços ténues, os que sobram ou sobraram.

O elevador marcado para o terceiro andar, por hábito da mão, é assim que percebemos que o corpo também regista e ordena. Depois o cérebro corrige. E já corrigiu a curva numa certa rotunda, já não vira em automático para o bairro do quintal com cheiro de goiaba.

O grito dos pavões é aflitivo e contudo parece ter origem amorosa. Desconheço-lhes a idade, sei que a minha parece incapaz de se afligir assim por necessidade de amor, dele ainda há contudo uma inscrição, não sei se mais forte na memória do corpo, se no cérebro ou coração ou nessa junção de todas as partes, dizem que é aí o lugar do eu.

~CC~

6 comentários:

  1. Excerto de uma obra literária?!
    Não é, mas podia ser.
    Uma escrita de qualidade.
    Gosto da porta na sua fealdade.

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  2. Há lugares em nós... muito sensíveis e com memória.
    Um abraço.

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    1. Sim, coisas que guardamos, umas por querer e outras mesmo quando não queremos.

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  3. Toda a ruina me defrauda, como se me sinta um pouco responsável por ela. Mas todos sabemos que o novo nasce do velho e todos pagamos uns aos outros essa injustiça original: faz parte da dialéctica do mundo.
    Entendo esse estado de aprender a não virar para certo lado. Mas, se seguimos distraídos, é aí que vamos parar. Já me aconteceu. Também.

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    1. Como se a memória do corpo nos comandasse automaticamente...Boa semaa Bea!

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