terça-feira, 29 de agosto de 2017

Um amor estúpido



O que é um amor estúpido?

Aquele que encontro quando arrumo os papéis, um caderno cheio de sms passadas para ali depois de as apagar quando já se vivia o tempo das cinzas. Mas como pude fazer uma coisa dessas? Com que alegria o atiro para o lixo, como o pude guardar para lá de dez anos. Ainda bem que vivi o suficiente para ser eu própria a deitá-lo fora, em vez da minha filha ou outro ente querido.

Recordo que houve dois tempos de paixão e dois de cinzas e está tudo ali no caderno, até com esse intervalo. Antes de eu dizer que não haveria terceira, nunca mais. Antes de eu me dignificar, fui alguém que se estupidificou num processo amoroso. Ao descalabro da paixão adolescente tudo perdoo, fazia parte, ao eu adulto nem por isso. Mas aprendi tanto com aquele erro, mas tanto. Acho que já reconheço uma conversa de bandido ao longe, a sedução embrulhada na fragilidade, num piscar de olhos malandro, nuns lábios estendidos no final da primeira saída juntos, que ainda recusei, mas não por muito tempo. Tanto namoro em muitos mails, muitos sms por dia, muitos códigos amorosos, agora olhados de longe, tremendamente ridículos. Mas não me arrependo, viver a experiência de um amor sem amor faz-nos perceber tão bem como os peixinhos se deixam enganar pelo isco dos pescadores. Um amor pode ser tão grande ou se imaginar tão grande que chega para dois ou três, o outro não nos ama mas aparece tão iluminado pelo nosso amor que achamos que sim. Fui uma presa fácil, dócil e deslumbrada e, como tal, um bocadinho estúpida. Ao ler isto, reconheci-me. Incrivelmente também coincidiu com ter encontrado o caderninho e umas coisinhas mais. Arrependimento? Já nenhum. Nem raiva, nem ódio, nem nada, às vezes até consigo ter a memória de um momento terrivelmente bom numa coisa que era tão má.

Não há amores estúpidos estão vocês a pensar. Se calhar têm razão. Mas pensem duas vezes se não nos estupidificamos às vezes por amor, perdendo o norte e com isso nos perdendo a nós também.

E o que é um amor bom? Vou pensar nisso.

~CC~








6 comentários:

  1. Querida CC, a mim não me parece nada estar perdida.
    E de facto eu acho que não há amores estúpidos. O amor não se escolhe, pois não?
    :-)

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  2. CC, tenho para mim que há sempre uma razão para se proceder de determinada forma e que o que se fez ou não se fez apenas pode ser analisado e explicado à luz daquelas circunstâncias.
    Portanto, não há amores estúpidos quando se está a vivê-los e as pessoas se sentem bem e acham que é melhor estarem juntas.
    À distância é que dizes que o amor era estúpido... Essa faz-me lembrar aquela expressão "se a minha avó não tivesse morrido... ainda era viva."

    Deve ser por interpretar deste modo o que vai acontecendo e o que decido, que não costumo ter arrependimentos em relação ao curso da vida.

    Guardo poucas coisas físicas e de todo não guardo quando provieram de pessoas que deixaram de ter importância para mim. Deito fora sem qualquer problema.

    Um amor bom é um amor que nos faz sentir bem e que (nos) acrescenta.

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  3. tão bom este post, tão bom. também me reconheço aqui, como muitas vezes, e também vou pensar nisso do que é um amor bom.
    obrigada :)

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  4. Enquanto não damos pela parte "estupidificante", o amor é bom. O amor é bom em momentos. Aqueles momentos em que nos sentimos felizes e não receamos o ridículo.

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  5. O amor bom será por ventura aquele cuja a intensidade nos deixe respirar de vez em quando de modo a que possamos absorver as suas explosões com alguma tranquilidade, retardando assim o tempo das cinzas.

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  6. Susana, andei perdida sim, mas encontrei-me. A história já tem para lá de dez anos e não durou mais do que dois e ainda assim intercalados. Se o amor se escolhe? Talvez não, mas podemos escolher a forma como o vivemos, ou pelo menos tentar.

    Isabel, comungo nisso de deitar fora embora não seja capaz logo, logo. Quanto ao mais, partilho menos, não é o amor que é estúpido em si, mas a forma de o viver, essa é ou pode ser. Justamente quando não nos acrescenta nem nos dignifica.

    Ah Ana, fico à espera:)

    Luísa, sim, creio que é bom mesmo que não seja sempre feito de momentos felizes, alguma dor, alguma infelicidade são às vezes parte também. O que não deve fazer parte é a mentira, o engano, a falsidade.

    Impontual, se muito intenso para dois pode afogar-nos mas se se muito intenso apenas para um pode mesmo matar-nos.

    ~CC~



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