segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

As noites do Dragão

 

Não, não vou falar da noite eleitoral de ontem...para múltiplos significados, análises e opiniões há por aí blogues de sobra (mas também já houve mais...). E as sondagens? O povo português continua a ser surpreendente e a teimar em não alinhar com elas. E os comentadores pagos a peso de ouro que acertam tudo ao lado?!

Mas por causa da noite de ontem, hoje sinto-me a precisar de uma noite do Dragão, ou seja, de uma aula de Chi Kung.

Com o evoluir da pandemia e apesar da pena que sinto por tal alteração, as manhãs tornaram-se noites e o ar livre e depois o ginásio passaram a ser a janela online pela qual o professor espreita. A mudança foi-me difícil e demorei mais a conseguir, dentro de casa, desligar-me.

Na última aula finalmente fui onda do mar, bocadinho de espuma, gaivota planando. Finalmente deixei que o meu corpo se transformasse num bocado de natureza, parte de um universo maior, gota entre gotas. Abracem-se, pediu ele no fim. Mas não havia ninguém para abraçar. O esforço teve que ser maior.

~CC~





terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Os que não...

 

Para os académicos eu sou uma "pessoa do terreno", para as "pessoas do terreno" eu sou uma académica. Isto costuma ser apenas um sussurro, alguma coisa que não me é dita claramente, olhos nos olhos. Ontem, disseram-me com toda a clareza, talvez escudados pelo écran do teletrabalho, curiosamente depois pediram-me desculpa, como se me tivessem ofendido. Calei-me, explicar seria sempre muito complicado, demorado, até penoso. 

Esta questão de não pertença é um espinho cravado na minha pele há muitos e muitos anos. Umas vezes dói-me, outras nem por isso. Talvez haja um limbo, um não lugar, uma terceira via onde nos iremos encontrar, nós, os que não pertencem.

~CC~

quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Manual para pessoas que vivem sozinhas (I)

 

Aí vão os primeiros três conselhos:


1. Não deixes acumular a loiça no lava loiças para além da dimensão do próprio.

2. Não deixes de pôr a mesa e comer com faca e garfo, evita a colher, o prato de sopa e o sofá.

3. Tenta vestir roupa de sair todos os dias, mesmo que mantenhas sempre as pantufas/chinelos.


Querem ajudar? Tentemos chegar às 12.


~CC~

Inspirado no Manual para mulheres de limpeza, de Lucia Berlin.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

As minhas mãos

 

O trabalho intelectual não tem forma, matéria palpável, cor ou cheiro. Angustia-me isso algumas vezes, é um pó que parece desparecer ao primeiro sopro. Tantas horas para isto, um quase nada.

Quereria ter aprendido a fazer coisas com as mãos, ver que elas seriam capazes de arranjar coisas, costurar roupas, fazer bordados, amassar pão, girar a roda de oleiro, arrancar ervas daninhas. Circunscritas ao trabalho doméstico e culinário, como me parecem desaproveitadas.

Antes da pandemia ainda lhes dava uso em pele alheia, usando-as para tocar, afagar e abraçar. Agora cada vez menos. Vai sobrar-me em mãos o que me excede na cabeça.

~CC~

sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Da Maldita...

 

Às vezes lembro-me dela, da maldita.

Soube que estava mesmo mal quando a pessoa que profissionalmente mais me detesta me ligou várias vezes. Nunca consegui atender. Se atendesse era para lhe dizer que não ia, nem queria morrer, podia parar de me ligar.

Soube que a doença estava quase vencida quando ela voltou a ser quem era, espetando aqui e ali uma farpa, fechando portas que eu queria abrir, minando caminhos que eu poderia trilhar. Soube então que estava viva, que ia viver mais uns anos.

É verdade que ninguém deseja inimigos e eu também não mas são eles que nos dão sinais inequívocos e precisos deste tipo.

~CC~

quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Outros lugares

 

Há os lugares onde o sol se põe, invadindo com a sua beleza o nosso corpo por inteiro. Mas há também lugares virtuais, passamos por lá por saber que existe atrás deles uma pessoa singular, que nos agarra, enriquece, emociona e/ou diverte ou todas essas coisas. Dantes, faziam-se listas dos blogues do ano, coisa que parece ter desaparecido, não que sinta a falta desses prémios, selos ou distinções, sou mesmo avessa a eles. Apenas sinto vontade de lhes agradecer por existirem e lhes pedir desculpa por ainda não os ter colocado ali, junto das outras ruas do meu bairro (o tempo, sempre a fugir para outras prioridades).

Erva Príncipe, da Bea

A Faca não corta o fogo, da Flor

Não mudes nunca, da SJ

Atravessado, do Manel Mau-tempo.

Peregrinatio, de Homo Viator.

Imprecisões, é de um colectivo, mas é a Alexandra a sua alma (só é pena que faça longas ausências).

Têm a delicadeza de nos responder aos comentários e/ou de nos visitar e para mim a reciprocidade e a interacção são importantes, embora respeite quem não a quer ter.

E ultimamente a Linda Blue, mesmo sem comentários e sem visitas, às vezes passava lá, agora passo com regularidade para ver como ela está e verifico mais uma vez que o humor é um dos ingredientes mais importantes da grande e longa batalha, ela usa-o ainda mais e melhor do que aquilo que eu fiz. Quem é que coloca o nome de Natércia a uma peruca?! Só mesmo a Linda que é mesmo linda.

Agora não desapareçam nem mudem todos para o Twiter ou FB ou qualquer outra coisa dessas. É que ainda tenho saudades destes:

Miss Smile

Cuca, a Pirata

O sítio das pequenas coisas

Palmier Encoberto

~CC~


domingo, 9 de janeiro de 2022

Inscrição


 



Poderei ver mil coisas novas e quero vê-las, ainda assim não perderei o amor pelas antigas, pelos lugares inscritos na vida, aqueles a que sempre voltarei.

~CC~



quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

Inundados, aturdidos, atolados...

 

O meu mail institucional deixou de comunicar com o exterior, só aceita comunicações de endereços internos, assim como todas as plataformas onde entro com a palavra passe da instituição. Isto dura há mais de um mês, acarretando-nos dificuldades que até agora não imaginávamos. Fomos atacados por mails fraudulentos, algumas pessoas entraram nesses links e ficámos a constar de uma lista negra, os informáticos mal conseguem passá-la para cinzenta.

Parece que também a SIC e o Expresso foram alvo de piratas informáticos. Alguém consulta um site, por exemplo de comparação de preços de um produto e a seguir recebe uma chamada de um vendedor de uma dessas empresas. Se vir a publicidade de um novo automóvel, durante semanas receberei publicidade de automóveis, dessa marca e de outras. Se sair de um restaurante pedem-me imediatamente que o classifique com estrelas. Enquanto trabalho, inúmeras notificações de notícias vão chegando, ainda que sejam de um jornal minimamente credível, são incomodativas. Um colega contou que anda sempre com o GPS do TM desligado, mesmo assim recebeu informação via google a dizer onde tinha estado no fim de semana. Há pessoas que nunca mais ligaram, nunca mais lhes ouvi a voz, só as vejo escrever em "grupos" de whatsapp, outras já nem escrevem, só colocam bonecos.

Estamos inundados, aturdidos, atolados, controlados, tontos. Não se aguenta mais. 

Ainda voltaremos a escrever cartas, postais e telegramas. 

Ou iremos curar-nos para retiros de silêncio numa montanha qualquer. Eu já ia.

~CC~


terça-feira, 4 de janeiro de 2022

Bairro

 

"Já tenho as suas bolachas".


(É isto o bairro, e não é por saberem quem sou, onde trabalho ou que títulos académicos possuo, nunca lhes falo disso. É apenas por voltar com alguma regularidade ao lugar onde se diz bom dia, se arredondam os trocos e sabem daquilo que gostamos)

~CC~

domingo, 2 de janeiro de 2022

Destino(s)

 

Depois da grande viagem não saciei a fome, pelo contrário, é como comermos algo que nos sabe bem, o sabor fica gravado na memória mas nunca saciado. Além disso, cada vez que supero uma coisa que receio, fico muito mais corajosa, alimentada pela força que aquilo me deu. E superados os dilemas que sinto no binómio "o turismo mata, o turismo alimenta". Mas mais uma vez senti que aquilo que aprendi indo é insuperável, não há livros ou filmes que o substituam.

A única coisa boa do uso do alfabeto grego no baptismo das variantes do vírus maldito é que me recordou que nunca fui à Grécia. Mas não posso ficar na margem das coisas, essa grande dificuldade do turismo de massas, mostrarem-nos as coisas em vez de nos deixarem descobrir. Pelo menos que fique a meio termo. Tenho de pensar bem, para além de alimentar o mealheiro. Venham daí sugestões dos viajantes.

~CC~


sábado, 1 de janeiro de 2022