domingo, 20 de maio de 2018

Fazer-me rir


Por breves momentos estive perto do cristianismo. Por um tempo um pouco mais longo presa de uma teia qualquer de misticismo, daquelas que podem ter  muitos nomes e viajam entre o Siddhartha e o Fernão Capelo Gaivota. Só me sobrou o gosto pelo yoga e o espanto pela beleza da terra. Depois tornei-me racionalista e descrente de quase tudo. Fez-me bem ao sentido crítico, apurou-o. Por fim cheguei ao princípio, ou seja ao humanismo, ainda que considerando o ser humano apenas essa partícula ínfima do infinito, o que se não destrói o humanismo lhe acrescenta algum relativismo. Faz-me bem ter esperança na humanidade, não obstante alguns péssimos exemplos dos dias de hoje.

Isto tudo era só para dizer que não sei de onde me vem a capacidade de perdoar. Não aquela coisa boazinha do perdão instantâneo, da lavagem imediata da mágoa, muito menos o dar a outra face. As coisas demoram tempo. Mas acontecem ao ponto de poder ter saudade de alguém que não foi completamente bom para mim (isto se houver alguém completamente bom). Hoje tive um sonho com alguém assim. E no sonho sentia saudade de algo que aquela pessoa que agora nem sequer chamo amigo fazia muito bem. Como se do tempo tivesse apenas sobrado aquela particularidade lavada de qualquer mágoa. Fazer-me rir, era isso. Saudades de alguém por essa pessoa me fazer rir. Tinha graça, às vezes basta isso para fazer com que alguém se torne especial.  

~CC~

3 comentários:

  1. Partilhei muitos desses caminhos. Uma diferença é que, infelizmente sei porque perdoo. Dantes era por empatia ou por esperança. Agora é por indiferença.


    Naqueles inquéritos tipo: qual é qualidade que mais gosta num parceiro? o fazer rir está sempre no topo.

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  2. Acho que, passado um tempo, o perdão é inevitável. A mágoa dilui-se, a memória é seletiva e precisamos de reconciliação, se não com o outro, por certo connosco próprios.

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  3. Luís, essa indiferença é uma boa defesa sem dúvida mas é arte que não sei praticar. Já rir, é quase o melhor remédio para tudo.
    Sim Luísa, parte é mesmo essa reconciliação connosco.
    ~CC~

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