sábado, 15 de agosto de 2020

Latitude Y

 

Será que um lugar sem mar pode ser meu?

Sim, se ouvir o som da água nos açudes, se o olhar se poder perder de vista pelo céu cheio de estrelas, se os cães tiverem nomes e forem mansos e doces. Se as pessoas sorrirem por trás da máscara, nos pedirem desculpa por nos tirarem a febre e nos disserem que se chamam Maria.

Sim, se puder caminhar junto aos trilhos da água, por caminhos de verde e o vento sussurrar segredos e melodias.

Sim, se houver junto de mim alguém próximo, com quem se pode partilhar a palavra e o silêncio, recordar passados e inventar futuros.

Sim, se houver um horizonte limpo, por onde volteiam felizes as andorinhas sempre que o sol começa a declinar.

A mais de 200 Km do mar e, ainda assim, feliz a maior parte do tempo. Afinal talvez me chegue ter ar puro, silêncio e estrelas.

~CC~


3 comentários:

  1. Excepto se tem um mar particular, específico, não pode, em Portugal continental, estar a 200km do mar. Acho eu, que não medi distâncias senão a olho.
    Vive-se de toda a maneira e feitio CC, somos muito adaptáveis e plásticos sem sermos de compra.
    Digo eu que sou muito pés na terra: ar puro, silêncio e estrelas são paisagem, conferem certo bem estar, mas há todo um conjunto de exigências presente, ou não pode apreciá-los:).
    Se eu pedisse tal, circunscrevia-me a um punhado de lugares. Mas aprendi a amar a aridez da terra a que pertenço, o sofrimento dos seres vivos que nela se desenvolvem à míngua de verde e água, o vagar parado das cegonhas no ar que treme de calor; e, na tardinha sem frescura, o seu jeito de sentinela paciente nimbada de indiferença aos sucederes do mundo. E é isto o sentir do alentejano sem sonhos, um estar às portas pela noitinha, janelas a fazer corrente de ar para ser suportável a noite que chega devagar e mansamente se vai juntando a todas as coisas até à dissolução, não está aquela árvore, nem os animais no curral, nem a terra que suspira por alento. E talvez sonhe, sim, talvez então construa na mente um riacho saltitante que tudo dessedenta, mas há-de morrer manhãzinha quando o sol desponte e as coisas voltem a si. A realidade pode ser gume terrível.
    Bom domingo.

    ResponderEliminar
  2. Bea, tem que pensar em diagonais em vez de em linhas rectas:)
    No mas, o seu texto é de grande beleza e acho que compreendo o seu sentir.
    ~CC~

    ResponderEliminar
  3. Pois. Mas isso significa a hipótese que coloquei, não é um mar qualquer o que apetece:).

    ResponderEliminar

Passagens