terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Vinho quente com bagas de romã



Penso neste Dezembro que entrou tão atípico, desfeito das minhas poucas rotinas. O grupo dos amigos que não se juntou na aldeia alentejana pois as mortes dos seus entes queridos mais velhos invadiram-lhes a casa e retiraram-lhes a energia para tal. A carga excessiva de trabalho a agigantar-se numa ansiedade colectiva de tudo ter que estar pronto antes que o novo ano entre, calendários de contas que nunca foram os meus e agora se me impõem, acorrentados a projectos e verbas europeias que nos deixam à beira da esquizofrenia. Na maior parte das vezes penso que só queria dar aulas em paz, sem as outras coisas que dobram o tempo que lhes dedico. E os meus olhos cansados nos olhos deles cansados, vejo-nos em espelho e, é talvez nessa simetria, que ainda assim nos compreendemos. A aula acaba e é já noite.

A estrada do Sul por fazer, cada vez mais abandonada, até para a comemoração maior do mês. Este ano, outras latitudes e que esforço foi encontrá-las. Uma família que consegue não naufragar no Natal é, apesar de tudo, grande.

E, contudo, devo dizer, Dezembro é o único mês do ano em que me apetece meio copo de vinho quente com bagas de romã.

~CC~

domingo, 30 de novembro de 2025

Musiquinha de Domingo (X)

 



Diga que você me adora. E que eu não presto.

São assim as contradições do fim do amor. Verdades cruas. Ainda assim diga que você me adora.

~CC~


Nota: há ruído sim, parece uma gravação amadora feita num espectáculo ao vivo, oiçam mais do que uma vez.

sexta-feira, 28 de novembro de 2025

Capa negra

Essa maldita morte que vem buscar gente boa que nos faz falta. Nem sequer era meu amigo mas amigo de amigos meus. E ainda assim cobriu-me uma noite escura, uma sombra interior, um medo tão grande cá dentro. Talvez precise apenas de chorar. 

Ou então é saber que aquilo que o levou tão perto esteve de me levar. E dizem que não raro volta. Os fantasmas nunca nos largam e já não são iguais aos que eu inventava na minha infância, tinha um como amigo secreto que só eu via e me protegia, agora são vários e vestem capa negra.

~CC~

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

São fortes as correntes e arrastam tanto

O sabor de uma coisa é parcialmente desfeito quando uma parte de nós já tem que estar na coisa seguinte. 

Damos por nós a pensar que já a podemos riscar da lista e, ao fazê-lo, entendemos que já estamos na noutra e na outra e na seguinte. E há erros porque a velocidade é muita. E o corpo dói.

E sabemos tão bem que a vida não é para ser vivida em curto circuito, em emboscada, em apneia. Sabemos e não conseguimos, são fortes as correntes e arrastam tanto.

Valem as paragens, em cada uma delas abro bem a boca para sorver o oxigénio e continuar a respirar com alguma convicção e encanto. 

~CC~