segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Eu ao quadrado e ao cubo, da pestana à unha do pé


Os psicólogos, sempre os primeiros a ser chamados em caso de anomalia técnica, emitem alertas a um ritmo que não acompanha a velocidade das selfies que são tiradas por minuto, não vou mais longe. Chamam-lhe a sociedade narcisíca, cada um se ama a si mesmo e quer que todos o amem. É difícil para quem não se ama assim tanto nem tão pouco quer que os outros o amem. Uma terrível desadaptação é o que ando a experimentar. A aversão está a ser tão grande que desejo conhecer pessoas sem FB, pessoas sem mail e mesmo pessoas sem Internet. Depois tento controlar-me.

Fotografado cada bocado de perna, olho, nádega, há que colocá-lo a circular para que alguém do outro lado do mundo possa pasmar. Se não se for suficientemente lindo, avança a operação plástica mais veloz do mndo: o photoshop. Para alguém que raramente tem vontade de tirar uma fotografia a si própria e padece de uma crónica falta de paciência para a imagem, é razoavelmente absurdo, passamos a sentir-nos estranhos no mundo, fora dele. Faço alguns esforços de normalidade, ontem a minha filha resolveu ganhar um pano para estendermos na relva, à conta de uma selfie das duas. A coisa era razoavelmente ridícula, uma das nossas operadoras de TV/telefone e NET oferecia os panos a troco de tirarmos uma selfie (fazíamos de conta que a tirávamos) porque quem a tirava eram eles com o nosso (dela) TM e este tinha obrigatoriamente que ter acesso à NET para que a colocássemos no site deles. Fiquei é claro apavorada com a ideia de a troco de um pano fazer publicidade a uma marca, aparecendo a sorrir no site deles. A minha filha tranquila só se ria, assegurando-me que ela tratava do assunto. Lá tiramos a foto ridícula que lhe valeu uma hora de sesta na relva porque o vestido branco que levava não era compatível com o espraiamento ao natural. Perguntei-lhe pela foto, riu-se, é claro que não a colocou em lugar nenhum, eles contam com a ideia de que todos querem aparecer e não verificam se a colocamos mesmo. E riu-se ainda mais de mim: até podiam obrigar-me mas no minuto a seguir ia lá e apagava. Elas já sabem viver nestas coisas e se são espertas, brincam ao gato e ao rato com a exibição pública. Se se deslumbram, lá ficam agarradinhas. Eu ando a aprender mas não quero aprender muito, só o mínimo necessário para não cortar completamente com este estranho mundo.

~CC~



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