quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Deus, deuses, deusas



Não posso deixar de dizer que sim, nestes últimos quatro meses senti algumas vezes vontade de entrar numa igreja. Mas não foi para encontrar Deus, apenas o silêncio que a civilização me roubou. Talvez alguma paz. As conversões a um culto religioso quando a morte se intromete no caminho da vida são mais que muitas. Algumas impressionaram-me por serem de ateus convictos, percursos inteiros ligados a outros horizontes, outras crenças (por exemplo, Maria Barroso, perante o acidente do filho João). 

Já eu seria incapaz de rezar por mim própria, de pedir a Deus que me salve, se existe, parece-me profundamente injusto fazer-lhe esse pedido com tanta coisa que lhe poderia pedir, quantas vidas se poderiam salvar de uma vez só se certas coisas não existissem (por exemplo, alguém a entrar a disparar numa discoteca na Turquia). Também não me posso converter pensando numa outra vida, num suposto além no qual eu ou parte de mim teriam continuidade, pois isso seria apenas um negócio, oferecer a minha fé em troca de um poiso no infinito. Também não me atraem outros percursos alternativos, integrados de uma mística susceptível de sossegar-me, pois há muito que eu acho que somos meros pontinhos no universo, só os pontinhos que nos tocaram é que sentirão a nossa falta. Sou pequena, sou finita, sou mortal. Bem sei que assim tudo é mais difícil, mais penoso, mais labiríntico. E se eu tinha razões para acreditar pelo menos nos deuses. Primeiro porque tenho o nome da deusa terra, coisa com que o meu pai me brindou para enfrentar a vida, depois por já me ter salvo da desgraça e da morte uma série de vezes. Coisas mirabolantes que não acontecem a quase ninguém ou que parecem de filme. Perante isso, isto é tão terreno, tão real, acontece a tanta gente, está a acontecer-me algo que me pode matar mas que é quase trivial. Sou uma entre milhares, mesmo com o meu nome de deusa.

~CC~






5 comentários:

  1. deu-me vontade de reler 'a cidade da alegria' de dominique lapierre. já leu?

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    1. ana, já me falaram há tempos desse livro. Entretanto, já me tinha esquecido. Que bom que mo trouxeste à memória. Vou já pô-lo na minha lista de 2017. Obrigada :)

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  2. É verdade que somos formigas e que a nossa história é apenas uma entre tantas outras neste vasto mundo. Mas, ainda assim, ela é nossa, é a única que temos. A única que vivemos. E só por isso, ela é especial, muito especial.

    Um abraço, CC

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  3. Ana e Miss Smile, também não li o livro mas fiquei curiosa e fui ver o resumo, parece interessante. Sim, cada vida é especial, para os que não nos conhecem, apenas mais uma, para aquele que a vive, apenas aquela (não obstante o meu pai considerar que sou uma alma antiga, que já tive várias encarnações e muitas vidas na terra). Por último, quando ele estava mais próximo, já não era capaz de falar sobre a morte nem sobre nada com o brilhantismo que tinha antes.
    ~CC~
    ~CC~

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  4. CC e Miss, a versão integral do livro é dificil de encontrar. Existem resumos. Encontrei num alfarrabista.

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