quinta-feira, 28 de maio de 2015

Balancete




Este talvez tenha sido dos anos mais trabalhosos da minha vida, é também o primeiro desde há muito que, já este mês, irei recorrer à conta ordenado. Isto porque:

  - trabalho em Educação (não, não é a mesma coisa que na FIFA).
  - parte do trabalho que faço a mais é totalmente gratuito.
  - o trabalho que faço a mais é remunerado a um valor hora abaixo do de uma empregada doméstica, e sendo predominantemente para o sector público, só muito tardiamente é pago (espero pagamentos de Janeiro)
 - as despesas com saúde que tenho tido estão cobertas pela ADSE em margens mínimas
 - pago cerca de metade do meu ordenado em impostos vários.

Estudei para além do secundário (em anos): 3 (bacheralato) +5 (licenciatura) +3 (mestrado)+ 5 (doutoramento).

Bem sei que ter emprego é uma felicidade (não obstante ter estado 13 anos a contratos anuais no sector público e, em concreto, no ensino superior) e o futuro ser ainda tão incerto como quase sempre foi.

Toda a infelicidade é relativa e claro, esta está longe de ser das piores. Mas sinceramente não esperava que a meio da vida ainda tivesse que recorrer à conta ordenado para o dinheiro chegar ao fim do mês.

~CC~





segunda-feira, 25 de maio de 2015

Tanto desejo de silêncio


Terça feira passada estava no Algarve, na Sexta já ia a caminho de Trás os Montes, no Domingo estava com os meus alunos em Setúbal no projecto comunitário. Tantas coisas tão boas. E no entanto, eu, dificilmente à altura de as amar.

Não me custa nada isto, adoro engolir paisagens com os olhos, acordar noutro lugar, não fosse isto já ser já em tamanho excesso. 

É nestas alturas difíceis que amar as palavras faz-me desejar muito o silêncio. Por momentos queria apenas diluir-me na natureza, deitar-me na terra, fechar os olhos e escutar só o vento. Toda e qualquer palavra a mais é um excesso, uma orgia desnecessária, um desperdício de energia. Toda a exuberância me perturba e não quero saber mais coisa nenhuma, não quero ler mais, não quero conhecer mais ninguém. Detestei o orador mais amado por todos, não acho graça do que todos riem, não gostei o suficiente da minha própria comunicação.

É isto o cansaço. E por causa dele os vírus invadem-me, tão oportunistas que se infiltram em todos os cantos da minha pele, rebentam com todas as zonas com mucosas, colonizam-me, fazem de mim o seu magnifico repasto.

E detesto tanto a minha pele assim branca, deslavada, o meu corpo a destapar-se, a mostrar as partes que queria esconder. Qualquer psicólogo me recomendaria umas pílulas de auto-estima. Porém eu sei do que precisava. É a casa, o quintal, a árvore, os pirilampos, um céu grande cheio de estrelas, tudo quieto, fechar os olhos em plena tarde, ir ao mercado pela manhã, aborrecer-me de ter tanto tempo. Ler, ler por coisa nenhuma, para coisa nenhuma.

~CC~







quarta-feira, 20 de maio de 2015

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Em viagem


Mais uma saída em trabalho. Quatro dias para conhecer uma escola, saber como é, o que quer ser. Gosto tanto disto, gosto tão pouco disto. Não consigo explicar-vos mais, tem os dois lados lá dentro.

Dias repletos de gente, tanta coisa para ouvir, para ver, para conhecer. Metade do que se diz é desperdício, esse excesso é que me cansa, mais palavras vazias e poderia desmaiar. Retenho algumas, palavras ditas mais devagar, apenas alguns rostos expressivos, quase sempre as crianças. Alguns adultos de sorriso bom, o chefe de pessoal não docente que sem curso nenhum daria uma lição a muitos gestores, o funcionário que planta as batatas especiais e tem sorriso de menino. Há vozes de cordeiro, há vozes de lobos. Gente que vale a pena, gente que vale pouco a pena. Lutas, conflitos, dificuldades. Também coisas lindas, tão lindas que emocionam como a máquina que as crianças inventaram para apanhar as moscas.

Entre tantas coisas para absorver, ligam, mandam mensagens de trabalho, querem coisas. Nenhuma, ninguém me pergunta se estou bem, onde ando, se estou triste ou feliz. Há algumas coisa que estou a fazer mal com a minha vida ou todos nós andamos deste modo? Porque é que só viajo em trabalho e não pelo sabor do vento ou da paisagem? Porque é que trabalho tanto e conta do banco está quase a zero? Porque é que só recebo recibos pelo correio? Porque é que só me ligam por trabalho? Porque é que digo sim quando quero dizer não?

Ao fim do dia ou pela manhã só a imagem verde azul do campo mar me trazia alguma paz. E saber que te deitarias a meu lado, enrolado no meu cansaço.

Agora há silêncio e tudo parece tão distante.

Oiço este silêncio e tento saber se o meu coração bate, se ele pulsa, o que me diz, para onde quer ir.

~CC~





quarta-feira, 6 de maio de 2015

Que parva que eu sou



Paro na padaria/pastelaria porque na minha casa o pão é a única coisa que não pode faltar.

- O tempo voa, sabes que só falta meia hora para sairmos?
- Olha que bom.
- Bom? Chegamos a casa e continuamos a trabalhar...

É esta a vida de muitas mulheres, sol a sol, só mudando a tarefa. E contudo, dou comigo a ter inveja destas duas empregadas de pastelaria. Queria chegar a casa e ter que fazer o jantar e arrumar a cozinha e colocar a máquina da roupa a lavar. Mas não consigo fazer nada disso, como qualquer coisa à toa, enfio a loiça na máquina a correr, olho para o cesto da roupa e penso que ainda espera uns dias. Continuo a trabalhar até às 23h, meia noite, até o cansaço me levar a desligar o computador. Apeteciam-me tarefas manuais, sonho com uma pequena horta, um jardim, perder tempo a cozinhar bem, fazer mais docinhos caseiros, experimentar receitas novas. Chego absolutamente extenuada a Maio e Junho, aqueles meses em que me apetecia parar o tempo. Disse que sim a coisas demais, por amizade, por respeito, por necessidade de dinheiro, por pensar que ia gostar de as fazer.

É uma vergonha ter inveja de duas empregadas de pastelaria que estão a queixar-se, e com razão, da vida não lhes dar o descanso merecido. É uma vergonha pensar que queria ir para casa fazer o jantar devagarinho, saboroso, com carinho.

~CC~

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Mês meu



Não nasci em Maio, mas adoro-o, quase tanto como Junho, os meus meses preferidos do ano. Maio começa tão bem, com uma justa homenagem a quem trabalha, ou a quem pode trabalhar.

Para iniciar bem Maio tomei o meu primeiro banho de mar, coisa que alguns dos trabalhadores do Pingo Doce hoje não puderam fazer. Para os massacrar um pouco mais, há ainda as malditas promoções. Tinha vontade de lá entrar e desmanchar tudo, trocar as coisas das prateleiras e sair sem nada. Sozinha não teria efeito, se muitos, talvez. Haveria, contudo, como em quase todas as coisas, um reverso para o protesto, provavelmente seriam os trabalhadores a terem que fazer horas extras a arrumar tudo.

Há sempre gente capaz de estragar Maio, esse mês maduro e florido, em que largamos as meias e enfiamos os pés nus nos sapatos. Este ano, no lar algarvio, temos um ninho de andorinhas.

~CC~