Habita-me com frequência o sentimento de ter chegado tarde. Chegar tarde a uma coisa com a qual queríamos ter convivido mais cedo, que nos impregnasse antes, que fosse nossa vida.
Tenho muitas vezes esta sensação em relação à cidade em que actualmente vivo, ainda que viva muito fora daqui também. Mais ainda em relação ao livreiro velho e à Culsete. Ao contrário de outras livrarias que se destacam pela beleza ou lugar em que estão, a Culsete não tem nada disso. É só uma livraria no rés de chão de um prédio feioso, numa parte pouco nobre da cidade. Não tem café, nem sítio para tertúlias literárias, nem palcos, nem micros. É até um bocadinho sombria, parece sempre meio desarrumada. O que sempre fez dela o que é, foi o homem que a criou. Não é história que conheça bem, nem que dela me tenha apropriado. Fui vulgar cliente, dessas que entram como quem entra num lugar vulgar e se confronta com a grandeza do amor aos livros antes de tudo, primeiro que tudo. O que testemunho é apenas a experiência de como comprar um livro pode ser afinal um acto invulgar, uma longa conversa, um olhar sobre o mundo. Era assim que Manuel Medeiros, o livreiro velho, atendia na Culsete. Cada um de nós era um ser humano que ele queria conhecer porque tinha entrado lá à procura de um livro.
Não teve despedidas nacionais, nem honras de primeira página nos telejornais, nem apareceu pelos blogues nem foi mil vezes citados no FB. Era só o livreiro velho, um homem português excepcional.
Saber mais em http://papelamais.blogspot.pt/
~CC~
Heróis anónimos que, às vezes, fazem a melhor parte das nossas vidas.
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