sexta-feira, 19 de junho de 2015

Precipícios


Como é que se dá uma mão sem que o outro a agarre para nunca mais a deixar, invadindo depois todos os nossos espaços, roubando como quem usa isso de direito, um direito qualquer inventado pelo laço de sangue ou outro qualquer. Qualquer pessoa sugada por outra esgota. Numa família podem esgotar todos, após vários anos. Qual é a melhor ajuda a dar a alguém que precisa, que se desequilibrou, que não tem consciência plena de si, do que é e não é capaz, do que pode e não pode. Qualquer corredor de psiquiatria é uma viagem sem volta. Mas a terapia é longa e cara e exige um eu a tempo inteiro lá presente. Um eu que quase nunca existe nessas pessoas. O ideal é que os terapeutas sejam um sólido grupo de amigos, uma família coesa, um amor à prova de bala. Contudo, até essas teias podem ter buraquinhos.

Quantos de nós já não tiveram um amigo, um familiar, um amor antigo, alguém incapaz de tomar conta da sua própria vida, tão sôfrego de ajuda mas tão renitente em usá-la da maneira certa, em prol de um projecto de vida em que a autonomia é a melhor palavras para conjugar com a vida adulta. O dilema de sempre entre dar o peixe ou ensinar a pescar...mas nem sempre é a chave. Para ensinar alguém a pescar, coisa verdadeiramente difícil, é preciso que esse alguém queira, queira muito. E muitos parecem viver apenas do peixe ou das migalhas dele, sem arranjar energia para mais.

O mundo, ainda por cima, não está para os fortes, quanto mais para os fracos. O precipício pode ser um buraco com mel para os depressivos, esses que quando melhoram sem se equilibrar também acham que podem voar sem asas. Essa zona sem meio entre a tristeza e a euforia que alguns habitam é um passaporte para que todos à volta vivam sem paz. Também a dúvida, a falta de discernir qual o melhor caminho a propor, sabendo que a melhor proposta tem sempre que partir da própria pessoa.

Coragem é que desejamos, também o que queremos ter. Nem sempre o cansaço ajuda.

~CC~


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