segunda-feira, 27 de março de 2017

A voz do teatro



Era tão jovem. E nunca mais houve uma voz como a dele. Profunda, calma, firme. A maior parte das vezes dizia sempre o mesmo: temos que ter a coragem. E a coragem era estar naquela sala e entregar-se, não nos escondermos, tirarmos qualquer coisa de dentro para por cá fora. Era o teatro. Não houve outro lugar no qual tivesse crescido tanto como nas oficinas de expressão dramática que frequentei entre os 16 e os 18 anos. Não houve também outro adulto com mais influência sobre mim do que o João Mota, que teve a generosidade de acolher aquele bando de adolescentes no seu regaço como quem acolhe um bando de pardais sem ninho. Nunca mais deixei de amar profundamente o teatro.

Pedes-me agora que pense na frase que ele dizia também como incentivo, alento para a minha vida., para este presente.Ter a coragem. Tenho-a gasto tanto, tenho-a usado tanto, creio que a fonte não é inesgotável. Chega-me às vezes a fraqueza agora, não se traduz em choro, não se traduz em mágoa, é só incerteza, dúvida, algum vazio, fico ali parada naquela curva do horizonte a pensar em quem sou, em quem serei, em como será ficar, em como será partir. Não quero fazer despedidas, não quero pensar em ir, mas às vezes sem saber como já lá estou, e tenho que me esforçar para voltar atraz, pensar que há uma nova casa da partida. A voz dele, não sei se a voz dele me pode ajudar, mas foi em tempos a voz mais bela que conheci, mais poderosa. Era o teatro, a sua força e magia em pleno.

~CC~

3 comentários:

  1. um beijo emocionado (de teatro e de vida).

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  2. sabe, CC, o meu pai dizia-me - vamos andar para a frente. para trás mija a burra :)
    com todo o carinho, digo-lhe o mesmo.
    leio e releio os seus textos, e muitas vezes são eles que me fazem levantar e prosseguir.

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