O passado pode ter qualquer coisa de futuro. O passado às vezes bate à porta.
Foi isso que senti naquela noite, na sociedade recreativa, a ouvir jazz. Tinha sido ali que 60 anos antes a minha mãe tinha dançado no salão de baile e concorrido ao concurso da mais bela da terra. Saí com o cartão de sócia quente na carteira. No corredor a exposição era sobre os refugiados e na plateia quase tantos estrangeiros como portugueses.
Nada sabiam eles e elas sobre este futuro 60 anos depois.
Eu também não consigo adivinhar o que será este lugar daqui a 60 anos.
Conseguiria, contudo, passar os próximos seis a vir aqui todos os sábados ouvir música, não obstante ser moça de poucas rotinas, às vezes apetece-me ter um lugar onde ir sempre. Lembro então a leitaria no Rossio em Lisboa onde, jovens que éramos, durante três anos nos encontrávamos sempre, sem telemóvel para combinar, sem telefonemas prévios, sem saber quem encontraríamos, era ali o ponto de encontro e alguém havia de aparecer. Sou pouco dada à saudade das coisas. Mas de vez em quando infiltra-se no presente alguma coisa de um outro tempo e fica ali a durar um tempo, até que o meu pensamento parta em busca de futuro. O presente, esse nem sempre o consigo pensar e sentir, é tão rápido.
~CC~
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