domingo, 29 de novembro de 2015

O amor e as sms



Leio no jornal uma história muito interessante de uma mulher (estas histórias sobre o amor moderno são tiradas do jornal americano de maior tiragem e traduzidas para português e saem todos os domingos, gostei sempre muito das que li, mas é raro eu comprar este jornal). Esta mulher, cuja idade não é identificada mas terá seguramente mais de 30, saia há duas semanas com um homem. Decide enviar-lhe uma mensagem de teor amoroso soft que recorda o momento mais intenso que viveram. O homem não lhe responde até à manhã seguinte e ela coloca tudo em causa, sobretudo o sentimento que ele possa ter por ela. O vazio de uma resposta a uma sms pode, hoje, derrubar um amor. É o que quase acontece com o dela, no derradeiro momento em que ela decide (sozinha) esquecê-lo, ele responde.

Recordo o modo como eu e o meu amor trocámos mensagens matinais durante alguns anos, os primeiros do nosso namoro. Era um modo muito bom de acordar, de o saber ali, já que vivemos longe. Mas era também penoso sempre que ele demorava, sempre que eu não lhe conseguia responder logo, sempre que me atrasava e só conseguia enviar um pouco mais tarde. Um dia ele teve a coragem de dizer que devíamos acabar com aquilo. Ainda hoje não consigo saber com certeza o que senti. Por um lado ele tinha inteira razão, criava-nos uma dependência tonta, uma inquietação perturbadora sempre que o outro se demorava mais, podia iluminar ou acabar com o dia. As palavras também se iam repetindo, a nossa imaginação esbarrava na pressa, no quotidiano, na avassaladora voragem dos dias. E, contudo, há dias em que sinto uma imensa saudade daquelas mensagens. Era como se fosse um modo de acordar com ele. Provavelmente seria impossível de manter aquilo, seria tonto, seria uma ditadura, mais um hábito que uma vontade. Mas quem pode saber? No amor há muita incerteza, sabemos só que começa mas nem sempre sabemos qual o melhor rumo, a decisão mais certa, a palavra que há a dizer. Somos todos assolados pela ideia do que é o amor e isso combina vagamente com enviar sms de locais bonitos a dizer que gostávamos que ele(a) estivesse ali connosco. Há uma anedota absolutamente incrível sobre o valor da palavra no amor. Uma mulher tinha que escolher entre um homem que nunca tinha dito que a amava e um que dizia a toda a hora. Obviamente ela escolheu o segundo e só mais tarde percebeu que não era a única a quem ele o dizia. Provavelmente o primeiro amava-a mesmo.

E as sms, nisso estou de acordo com ele, tornaram-se, a par das fotos que se tiram de tudo e a toda a hora, uma espécie de imperativo categórico da nossa existência. Mas o facebook também, o estar lá, o ir lá várias vezes por dia. As pessoas já ligam pouco umas às outras quando estão perto. Recordo um jantar a que assisti de miúdos de 13/14 anos num restaurante, pensava eu que não ia ter sossego quando entraram, qual não foi o meu espanto quando constatei que passaram a maior parte do tempo agarrados cada um ao seu telemóvel. Quem sabe enviariam sms uns aos outros.

Um dia eu e a minha irmã inventámos uma empresa inovadora com o objectivo de amortizar o final de um amor, para não constituir um corte abrupto, o homem ou a mulher em situação de abandono, recorreriam à dita empresa para ir enviando na mesma sms, ainda que cada vez mais espaçadas e cada vez mais normalizadas. Quando ele/ela finalmente enviasse uma mensagem sobre o que se ia descongelar para o jantar, já ele ou ela não iam sentir falta nenhuma do parceiro, muito menos das suas sms.

~CC~




1 comentário:

  1. Por mais que não queiramos, somos seres de hábitos e de palavras. Faltam-nos uns e outros e ficamos sem chão. :)

    Boa semana, CC. Beijinho

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