segunda-feira, 21 de julho de 2025

Duas pérolas

 

Sentadas nas suas cadeiras de praia, muito magras, ainda antes de eu chegar, o que quer dizer antes das 9h. Ao início nem olhei, pensei que entre tantos estrangeiros seriam só mais duas sem paciência para deitar o corpinho na areia.

Mas depois chegou o sotaque, era puro algarvio como há muito não ouvia. E reparei. Dois chapéus de palha e dois fatos de banho daqueles dos anos setenta, não uma imitação, mas por certo ainda retirados de algum baú, ainda que não parecessem novos, estavam mesmo um pouco desbotados. E as cadeiras, as cadeiras também eram das primeiras que vi na praia, nada destas modernas que se enterram quase na areia. Nem queria acreditar quando uma delas disse que já tinha deixado os carapaus alimados para o almoço, depois era só cozer uma batatinha e uma salada. E explicou como fazia para os alimar. Ali entre todas as línguas do mundo, mulheres velhas com peitos postiços, novas com muto ginásio, mães jovens sempre atrás dos filhos, ali estavam aquelas duas mulheres tão serenas, tão livres, duas pérolas. 

É bom, não é? Eu dantes nunca vinha. Agora apanho o vai e vem, passa mesmo à minha porta. 

Aposto que naquele "dantes" estavam maridos já não moram neste mundo.

Estive quase para me convidar para os carapaus alimados.

~CC~


7 comentários:

  1. É um momento cheio de poesia e delicadeza ler a descrição encantadora de duas mulheres tão serenas e livres, como pérolas preciosas, que transmitem uma sensação de paz e beleza.

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    1. Foi mesmo o que me transmitiram:) A velhice pode ser um lugar de paz se a saúde não falta.

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  2. Já eu me vejo a fazer ao contrário: deixar de ir quando não tiver companhia.
    Mas é bonito ver pessoas de uma certa idade a aproveitar a Vida!
    Sem ofensa mas, dispensava os carapaus alimados. O meu marido é que adora.
    Um abraço CC!
    Sandra Martins

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    1. Conserve esse marido, se gosta de praia e de carapaus alimados cuide dele:) A Sandra debica um bocadinho e pronto...também se usam como entrada em vez de prato principal. Um abraço

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  3. Deitar o corpinho na areia, a partir de uma determinada idade, deixa de ser questão de paciência, chama-se impossibilidade, o esqueleto nega-se.
    Mas sim, acredito que sejam duas velhotas simpáticas e desimpedidas. A velhice tem uma coisa agradável: cada um usa o que lhe dá na telha e não se importa com opiniões alheias, ganha-se à vontade.
    Boa noite

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    1. Sem dúvida Bea, é isso que sinto a cada ruga que chega, uma certa liberdade que antes não tinha. Quanto ao esqueleto, sem dúvida toda a razão, o maldito às vezes não acompanha a nossa vontade. Dia bom, embora o vento assobia em excesso.

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    2. Sem dúvida Bea, é isso que sinto a cada ruga que chega, uma certa liberdade que antes não tinha. Quanto ao esqueleto, sem dúvida toda a razão, o maldito às vezes não acompanha a nossa vontade. Dia bom, embora o vento assobia em excesso.

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