Como é que podemos não nos conhecer?
É certo que passaram 25 anos e que eu para ela não seria mais do que uma professorinha em início de carreira, ainda à procura de uma identidade. Só mais uma que ela orientou com a sua voz pousada, os gestos muito lentos, um sorriso sempre presente. Eu toda uma revolução que ela ajudava a conter, aproveitando, contudo, o que isso tinha de melhor.
Esqueço tantos nomes e lembrei-me imediatamente do dela.
Estava mais forte, mais velha, mas a serenidade era igual. Igual a elegância com que lia, com que punha e tirava os óculos, igual o modo como se virava para dentro. Era ela. Ou não era?
Não era porque não podia andar de comboio, sair nos foros de Amora, estar ainda assim tão bem, depois de 25 anos passados, ser ainda tão loura, ter os mesmos olhos de cor indistinta.
O meu medo de lhe perguntar, de cair no ridículo, do que lhe poderia dizer depois de tantos anos. Eu ali ao lado, calada, hesitante, em viagem no tempo.
A Lisboa em que nos encontrámos já não existe mais, eu nem dou já aulas a meninos e meninas, nem quero mudar o mundo todo, contento-me com uns quantos pequenos nadas. Eu devo ter a idade que ela tinha quando nos encontrámos.
Quando sai ainda lhe lanço um olhar mas ela desvia os olhos dos meus. Deixo-a ir, não sei se ainda terá aquela voz doce. Nunca tive mestres, nunca segui ninguém, mas admirei algumas pessoas. Esta senhora foi uma delas. Ou alguém parecido com ela.
~CC~
Reconheço essa sensação de incerteza, quase certeza, contradição, hesitação no reconhecimento de alguém... Era ela, muito provavelmente, mas o tempo que passa instala uma cortina que, por clara que seja, parece, nestas situações, intransponível.
ResponderEliminarTomara sermos sempre crianças, não hesitaríamos na dúvida... também, ainda bem que crescemos, para não ocuparmos espaço que é de cada um. Mais uma vez o "meio termo" ganha. Ernesto
ResponderEliminarLuísa e Ernesto, quem sabe as pessoas devem perdurar na nossa memória no lugar em que as encontrámos, tenho sempre dúvidas em ver ou estar com pessoas que há muito não encontro, só quando elas insistem é que o faço.
ResponderEliminar~CC~