Fiz uma lista de coisas que quero fazer nos próximos meses, num duplo compromisso comigo mesma. Primeiro, viver cada dia como merece ser vivido até à data do próximo exame de diagnóstico sem a amargura e a ansiedade da ameaça do que para aí vem. Segundo, não incluir na lista nada do campo profissional, não porque não continue a gostar do que faço e a ocupar aí um tempo significativo, mas por ter ocupado já demasiado espaço da minha vida. Cheguei ao extremo de aceitar que viajar tinha que ser por motivo profissional, para fazer alguma coisa, não simplesmente para usufruir do lugar.
Há um número sete da lista, inadequadamente designado por grupo dos desenhos, afinal é grupo das plantas. Sempre fui uma visita esporádica e por isso não percebia muito bem o que faziam. Agora sei que me proporcionaram uma das noites mais bonitas da minha vida. Primeiro aspecto positivo, é informal, sem burocracia, necessidade de inscrição ou de indicação de quem somos, o que fazemos, o que levamos para comer e tantas coisas mais que nos atrapalham a implicação nas coisas. Sabemos qual é o sitio, a hora marcada, mais ou menos o que vamos fazer. Umas vezes caminhamos e observamos plantas, outras desenhamos flores ou plantas na calma de uma salinha, ainda há momentos em que cozinhamos com ervas e outras coisas mais. Às vezes delicadamente, em certas sessões mais institucionais, alguém regista que estamos presentes. Que bom que é o verbo descomplicar.
Sabia que íamos ver pirilampos por ser o início da sua eclosão e por ser noite de lua cheia. Mas não estava preparada para a beleza do que aconteceu. Os campos acenderam-se e apagaram-se em pequenas explosões de luz voadora. Há quanto tempo não via pirilampos, a última visão, já há muitos anos, não foi em quantidade capaz de produzir este deslumbramento.
Transitámos do dia para o por do sol e depois para o início da noite e para a noite escura com iluminação natural. Cada uma das etapas foi intensa de beleza, qualquer coisa capaz de fazer transbordar um coração de felicidade.
Doem-me as pernas, não, não me dói nada.
~CC~
Nota: Os pirilampos aparecem nos meses de Maio, Junho e Julho, precisam de um ambiente natural e de zonas relativamente húmidas. Dão-se mal com pesticidas, tal como os seres humanos.
que maravilha de programa!
ResponderEliminarEstivesse a Ana mais perto e aqui estaria por certo...
EliminarLendo o seu texto, sobretudo a parte final, reparo que afinal as coisas mais simples, as que aconteciam e a que assistíamos naturalmente (e ainda acontecem), são as que procuramos: a mudança dia-noite; os pirilampos a brilhar no escuro, apagando e acendendo; caminhar pelos campos. E ser grata a tudo isso.
ResponderEliminarDeve pertencer e suponho que aconteça com a maior parte das pessoas que amam a profissão: entregamo-nos a ela, deixamos muito para trás por nela apostarmos. Talvez a CC tenha exagerado. No meu caso - que não é exemplo - grande parte do bom da vida ligou-se à profissão (também houve o reverso), é a minha única certeza no caminho; estava, sem hesitações, no lugar que me cabia. E nada lhe foi demais. Não vi muita coisa. Não viajei; não li tudo o que gostaria; assisti pouquíssimos filmes; fui a um mínimo de espectáculos, talvez tenha desleixado um bocadinho - pouco - a família. E tudo emanou dessa opção quase inconsciente de estar onde gostava e era sem véus. Filhos e profissão são indubitavelmente o meu empenho. Não contêm nada de excepcional, mas o resultado talvez nem seja o que mais importe. Na vida, como na filosofia, interessa o caminho.
"E ser grata a tudo isso"...é isso mesmo Bea.
EliminarAo ler este seu post CC, que nem parecia seu, estranhei o detalhe, a transparência, para quem costuma ser tão velada e minimalista na exposição. Gostei - dos outros também gosto, mas este foi diferente.
ResponderEliminarA autenticidade é a mesma, mas este reveste-se de uma clareza e do mesmo impudor que leva os poetas a revelar em público a sua alma conforme Deus a pôs no mundo.
E, depois, compreendo-a tão bem...
Realmente...não tinha dado conta mas fui um bocadinho descritiva...não é muito o meu estilo não, mas na verdade é o que sai...não gosto de me condicionar e saiu assim:)
EliminarUsufrua dos pirilampos, até julho eles andam por aí.