Arruma as suas coisas num cantinho das arcadas do prédio em frente. É um homem de meia idade, bem moreno, mas não consigo afirmar que é de proveniência asiática. Às vezes está sentado nas escadas com os olhos fixos nos carros que passam e já cruzei assim os meus olhos com os dele, tem uma aparência normal. Não o consigo abordar directamente pois bem sei que pode pensar que se trata de alguém que o quer fora dali e também não sei como o fazer, não posso questionar se precisa de alguma coisa pois por certo precisará de muitas, a começar por uma habitação. Contactei já uma instituição que costuma entrar em contacto com Sem Abrigo, encaminhá-los, mas mesmo assim hesito em lhes pedir que venham, apenas quis saber o tipo de trabalho que faziam. Às vezes desaparece, mas os pertences continuam ali, arrumados por baixo do cartão.
No outro dia eram 7 da manhã e ouvia-se bem o seu cântico, parecia uma reza e muçulmana, mas não tenho a certeza, apenas posso dizer que era de uma grande beleza e que a voz dele ecoava por estas ruas, poderosa.
~CC~
Com tanta hesitação, da qual também padeço, não se faz nada CC.
ResponderEliminarQuem sabe não é um antigo muezim que a vida tramou, pedaço de diminuta humanidade que sente agora a leveza da liberdade e o peso da fome.
É verdade Joaquim mas sempre aprendi que não intervir é melhor do que o fazer mal, isso retrai-me.
ResponderEliminarAcordar às sete com um cântico - por mais belo e portentoso - , nem sempre é bem recebido (sobretudo pelos dorminhocos ou os que a tal hora ainda descansam). Antes de ajudar não deveria talvez falar com ele? Por vezes, os motivos que os levam a tal condição permitem ver se desejam ajuda e de que tipo. Os homens são todos diferentes e convenço-me até de que existam sem abrigo que já apresentaram carta de demissão noutro tipo de vida. Contudo, continua a envergonhar-me que existam.
ResponderEliminarBom dia
Sim, acredito que para uma reduzida percentagem seja opção, para a maior parte é mesmo só pobreza e desespero.
Eliminar