sábado, 28 de setembro de 2024

Cinco conchas e um último banho de mar

 

Finalmente a praia grande, a da areia fina, bem alojada na minha memória dos dias felizes. Creio risível ter claustrofobia nas praias pequenas ladeadas por rocha que num instante se fazem a pé e em que se parece sufocar no ínfimo espaço para estender a toalha, não obstante a sua beleza. Rio-me de mim mesma mas respiro bem melhor nas praias grandes que não parecem ter princípio nem fim e onde basta caminhar para encontrar espaço. A cor deste mar é tão bonita como a cor do mar na minha terra e tem uma transparência e uma calmaria que me faz sentir tranquila e em paz. Tenho consciência que o Verão está a acabar e que o meu número de banhos de mar ficou numa média muito aquém do amor que lhe tenho. Como tal, entro na água fria para lhe sentir o sal, suspeito que pela última vez. Venho despedir-me, murmuro. Não há peixe nem gaivota que me responda. 

Encontrei um desenho de conchas na areia, eram grandes e bonitas. Quem apanhou conchas tão belas e as deixou ficar?! Trouxe cinco, deixei cinco para o próximo que as queira levar ou para o mar as engolir de novo. Não gastar tudo, não consumir tudo, não ter a avidez das coisas. Quase ninguém está nesta praia sozinha como eu, não anda pela cidade, não se senta para almoçar onde lhe apetece, às vezes sinto que me olham com pena. Mas eu sou feliz a conversar comigo, são longas conversas de mim para mim, momentos de introspecção absolutamente necessários para escavar e encontrar-me.

Cinco conchas e um último banho de mar.

~CC~



9 comentários:

  1. Uma descrição sugestiva. Aproveite.
    Um abraço.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Tenho bem a noção que a vida é breve e que posso não ter assim tanto tempo...por isso não me apetece gastar tempo a ser infeliz.

      Eliminar
  2. Perpassa neste seu texto uma sensação de liberdade, de liberdade e de solidão, de solidão mas não de melancolia, antes um sentimento de serenidade e tranquilidade consigo mesma.
    Penso que a maior parte das pessoas que vivem juntas, não se completam no outro a 80 por cento, nem talvez a 70. Talvez fiquem pelos 60 ou 55, partindo do princípio que abaixo dos 50 deviam mudar de vida. Poderá parecer um pouco cínico colocar o grau de satisfação de uma relação assim em valores, quantifica-la, mas creio ser o que realmente fazemos interiormente, mais ou menos inconscientemente, quando sabemos que nem tudo vai bem com o(a) nosso(a) parceiro(a) e decidimos colocar os prós e contras nos pratos da balança.
    Mesmo nos casais que se sentem realizados a 65 por cento (o que já não é mau de todo), dá que pensar como as pessoas se aguentam nos outros 35 e é aí que eu acho que ao lerem este texto, se identificam nele, talvez a 100 por cento.
    Assim como a velhice é tramada, esses 35 também são e vamos ter de viver com eles, especialmente quando já se tem 65, ou talvez não...
    Um abraço salgado.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Nestas coisas não há receitas nem modelos, cada um deve seguir o que o seu coração diz. Uma coisa lhe garanto, há solidões acompanhadas mais dolorosas do que as de alguém que vive só. E há quem fuja de si por medo de se encontrar consigo próprio. Eu vivo com o que a vida me dá e tento apreciar a cada instante a beleza que há nas coisas, com a consciência da sombra da morte. Um abraço

      Eliminar
  3. Acredito que estar sozinho é um estado de alma. Quanta vez estamos sozinhos em companhia. E tal acontece aos que vivem sozinhos e aos de companhia, mesmo que seja a tal, a mais próxima da plenitude. Apenas acontece. Por sermos humanos. E mesmo com amigos ou amores: acontece. E no entanto também o credo da companhia nos faz falta. há os momentos de nos pertencermos e os de pertencermos a outrem e sermos sociais e amigos e amores. É tudo vida.

    Também me convenço ter já feito a despedida desse mundo marítimo, uma das razões do meu verão. Foi pouco, mas será sempre pouco. Por mais que seja. No resto do tempo sou uma menina do mar que sobrevive num baldinho pequeno:).
    Bom domingo CC. E mais para as suas conchas.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá Bea, no geral concordo consigo. Apenas uma pequenina diferença, considero que estar só não é o mesmo que sentir solidão, sentir-se sozinho. E acredito que a segunda nem sempre resulta de uma escolha. Vi tanta gente a queixar-se de solidão e queria muito companhia, há muito abandono, sobretudo dos mais velhos. Boa semana!

      Eliminar
  4. Esta rua tem passeios tão belos. E dos, ainda por cima, não raras vezes me encontro nela. Como hoje.
    Muito obrigada, querida CC.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Passeie à vontade e sempre:) Um abraço querida Susana.

      Eliminar

Passagens